quarta-feira, 28 de setembro de 2011

O Vendedor de Sonhos


Em um pequeno vilarejo, distante das grandes capitais, o homem mais poderoso da cidade é dono de três cavalos, duas vacas e tem um fusca com mais de 20 anos. Um lugar que não conhece as novas tecnologias, não conhece o poder da mídia, vive em um mundo só seu.
O prefeito da cidade comanda pouco menos de 200 pessoas. Vivem até hoje sem eletricidade. Vivem felizes.
Um de seus habitantes curiosamente ganha a vida vendendo frascos de sonhos. As pessoas compram e bebem o elixir mágico que os fazem ver a vida de outra forma, alguns ao beber tem visões de grandes metrópoles, asssustadoras aos seus padrões de vida, outros se imaginam tão poderosos que são donos do mundo. Este homem passa suas noites preparando seus frascos, e durante o dia anda pela cidade vendendo sonhos, o momento mais aguardado depois do almoço.
Todos consomem seus sonhos. Todos têm grandes sonhos e ambições, mas não saem nunca da cidade. Eles têm o que precisam, vivem de sua própria agricultura, de suas terras. Mas os sonhos os alimentam em outro nível de realidade.
Há muitos anos esses sonhos são vendidos, ninguém sabe dizer o que há dentro daquelas garrafas escuras que os deixam sonolentos e vêem a vida de outra forma, mas é tudo que precisam para continuar felizes como vivem, exatamente onde vivem.
Ele sempre espera todos almoçarem e então passa com sua sacolinha, os sonhos são diversos, há de todos os tipos, e ele nunca voltou para casa com um frasco cheio sequer.
A cidade raramente recebe turistas, são poucos os que saíram para viver em outros lugares, mas quem saiu há muito tempo, nunca chegou a conhecer o vendedor de sonhos. Mas a neta do prefeito estava voltando, ela tinha se mudado para estudar fora, tentar trazer um pouco mais de conhecimento ao lugar onde passou quase toda sua vida. Quando retornou reencontrou velhos amigos, nada nunca mudou. Mas de imediato soube do momento mais feliz da cidade, à hora pós almoço em que o vendedor passava. Todos gostavam dele e conversavam por alguns minutos, contavam de seus sonhos e ele os tinha dentro de sua sacola. A moça intrigada com isso, não entendia porque as pessoas se entregavam a isso, poderia ser um alucinógeno, ou uma forte droga viciante, coisas que aquele vilarejo nunca vira antes, mas ela sim. Conversou com seu avô e ele mesmo confirmou que todo o dia compra um frasco de sonhos. Cada vez mais curiosa, ela que recém retornara ao seu berço, tinha que ver aquilo, tinha que saber o que era. Quis saber quem era a pessoa, o gosto que tinha beber um sonho.
E então, naquele dia, após o almoço ela o viu, lembrava-se dele, claro, era um homem simples que cultivava uma pequena horta com vários tipos de legumes, e vivia um pouco mais isolado que os demais habitantes, isso a deixou completamente perplexa. Ela viu toda a cidade comprar os sonhos liquidos e irem dormir felizes. Ela também bebeu, mas dormiu sem sonho algum, ainda assim, preferiu apenas sorrir e dizer aos parentes que teve o melhor sonho de sua vida ganhou sorrisos de volta como prova de que o vendedor realmente deixava a cidade feliz.
No final daquela tarde, ela foi visitar o homem que vende sonhos. Conversou com ele, ele garantiu que não eram drogas, tão pouco alucinógenos que ele nem imaginava o que significava essa palavra. Mas ela não estava satisfeita. Ela por ter vivido tanto tempo fora adquiriu uma caracteristica incomum para aquele lugar. A desconfiança.
E as semanas que passaram ela continuava a beber os sonhos, tirar o cochilo depois do almoço, mas ainda estava intrigada. Então resolveu conversar de novo com o vendedor, ela tinha que saber o que era. Mas ele não disse. A moça pensou até mesmo em levar um frasco para fora da cidade, pedir uma analise para saber o que consumia e viciava aquela cidade, mas não achou que seria certo fazer algo assim com aqueles sonhadores, mas por outro lado ela descobriria a verdade, mesmo que magoasse sua família e amigos.

Só o que ela não esperava é que o vendedor de sonhos um dia a convidasse para fazer os sonhos com ele. De prontidão ela aceitou e foi encontrá-lo á noite, tudo o que ele pediu é que o que ela visse, nunca fosse contado a ninguém, de modo algum, pois era aquilo que mantinha a cidade alegre e feliz, por menos que eles todos tivessem. Ela concordou.
Foi quando viu que o "sonho", nada mais era do que suco de graviola, uma fruta desconhecida da cidade, misturada com leite e açucar, ela ficou ainda mais perplexa, naquele momento, entendeu que o que ele oferecia era apenas um simples suco, mas que os sonhos e ambições estavam dentro de cada um daquele povoado que por medo de deixar a cidade, se deixava levar pela ciesta, afinal, ele vendia depois do almoço porque sabia que as pessoas já estavam cansadas e querendo descansar, então, só os incentiva a sonhar. Após saber isso, ela manteve sua promessa, viveu por mais alguns meses lá e todos os dias ao cochilar depois do almoço tinha grandes sonhos.
Quando foi embora ela finalmente entendeu que o vendedor de sonhos, apenas deu um nome mais bonito a uma fruta que ninguém nunca ouvira falar, até porque, sonhos todos tem, seja qual for, mas experimentar algo novo, num lugar tão rudimentar, talvez não fosse bem aceito e com as palavras certas, as pessoas realmente sonhavam com o que falavam. Nunca houve drogas ou alucinações. Apenas sonhos adormecidos dentro de cada habitante daquela cidade. E assim continuará enquanto aquele homem tiver sementes de graviola para plantar.

3 comentários:

  1. Teu melhor texto, Rafa.
    Super simples e fácil de entender, mas ao mesmo tempo de uma complexidade absurda. Muito bem escrito.

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  2. pô, valeu mesmo, nem eu esperava q ficasse tão legal...

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